VOCÊ ESTÁ SENDO ENGANADO?
Quantas vezes vocês já leram ou ouviram dicas de alimentação saudável como essas!
“Troque leite integral por desnatado: o leite desnatado garante o cálcio que é tão importante aos ossos, mas tem sua quantidade de gordura reduzida.”
“Troque a picanha por lombo: o lombo é mais magro que a picanha se for retirada toda a gordura aparente antes do preparo.”
“Em hipótese alguma coma frango com pele: a pele tem que ser retirada antes do cozimento, pois quando submetida ao calor, a gordura saturada e o colesterol da pele penetra na carne.”
A história de que a gordura é a principal causa das doenças cardiovasculares começou na década de 1950. Uma grande confusão científica perpetuada na área da saúde até os dias de hoje.
Na época o pesquisador Ancel Keys mostrou uma correlação entre a ingestão de gordura e o número de mortes para cada 100 mil habitantes em seis países diferentes.
Como ele era um dos membros da Associação Americana de Cardiologia, através da sua influência, as diretrizes oficiais sobre esse tema passaram a considerar a gordura como o fator mais importante para infartos e acidentes vasculares cerebrais.
Porém o que foi realmente demonstrado pelo trabalho do Dr. Keys era que a ingestão de gordura e um maior número de mortes aconteciam ao mesmo tempo, isso é chamado de correlação. Porém correlação não é e mesma coisa que uma relação de causa e efeito.
Para entender como essa teoria ganhou corpo e passou a ser considerada uma verdade é necessário conhecer os tipos de trabalhos científicos e analisar aqueles que foram produzidos da década de 1950 até hoje.
Depois de fazer isso posso afirmar que todos aqueles que gostam do sabor da carne e de outros alimentos com maior quantidade de gordura estão sendo enganos há muito tempo.
Não existem evidências científicas que sustentem a afirmação de que a gordura natural dos alimentos é causadora de problemas cardiovasculares!
Para aqueles que quiserem conhecer alguns dos trabalhos científicos mais importantes sobre esse tema, no texto que aparece abaixo, coloquei o resumo de cada um deles.
Grande abraço,
Carlinhos
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A ingestão de gorduras e as doenças do coração!
Bem esse lance de que gordura faz mal para a saúde começou por volta de 1950, um médico americano chamado Ancel Keys publicou, em 1953, um trabalho [1] onde ele avaliou a quantidade de gordura disponível em seis países e relacionou com o número de mortes por doenças cardiovasculares em homens entre 48 e 59 anos, o gráfico abaixo foi feito com os dados apresentados pelo autor na página 1403 [1].
Vocês podem notar que quanto maior o percentual de calorias vindas da gordura maior é o número de mortes em cada mil indivíduos. O país com a menor taxa de mortalidade era o Japão e o EUA foi o país com a maior taxa de mortalidade. Esse trabalho demonstra que existe uma correlação entre a quantidade de gordura na dieta e o número de mortes por problemas cardiovasculares.
A partir da publicação deste trabalho surgiu a teoria Dieta-Coração que tem nas gorduras, principalmente a gordura saturada, a principal causa das doenças cardiovasculares.
Ancel Keys juntamente com outras pessoas do American Heart Association (AHA - Associação Americana do Coração) publicaram, em 1961, um trabalho [2] com o seguinte título e seguinte conclusão:
Assim a partir de 1961 o posicionamento oficial do AHA sobre que "a gordura dietética e sua relação com infarto e derrames" passou a ser de que "a redução ou o controle da ingestão de gordura sob supervisão médica, com razoável substituição das gorduras saturadas por gorduras polinsaturadas, é recomendada como um possível meio de prevenir arterosclerose e diminuir o risco de infartos e derrames. Esta recomendação foi baseada nas melhores informações científicas disponíveis até o presente momento."
Dois pontos muito importantes sobre o trabalho de Keys [1] devem ser comentados. O primeiro é que podemos ver na tabela 4 (página 1404) que são apresentadas as taxas de mortalidade para todas as causas de 17 países e não somente dos 6 países. Isso nos leva a uma pergunta: qual o motivo de mostrar na tabela 3 na página 1403 os dados referentes às mortes por causas cardiovasculares de somente 6 países?
O segundo ponto é que os resultados deste trabalho demonstram uma correlação (para saber o que é uma correlação clique aqui) e não uma relação de causa e efeito.
Este dois pontos são suficientes para demonstrar as limitações desse estudo e fazem com que ele não possa ser considerados como "uma das melhores informações científicas disponíveis" como aparece na conclusão do trabalho de 1961 do AHA.
Na mesma época outros dois outros autores, Yerushelmy e Hilleboe, em 1957 publicaram um trabalho com dados da mortalidade por causas cardiovasculares e a ingestão de gordura em 22 países onde não foi possível demonstrar a correlação que aparece no trabalho de Keys em 1953. Abaixo podemos ver os dados destes 22 países.
Como é possível perceber (nos dois retângulos vermelhos) países com uma ingestão semelhante de gordura que apresentam taxas de mortalidade bastante diferentes, como os EUA (país n° 22) e a Noruega (país n° 17). Ao olhar o gráfico acima vemos que não é possível fazer uma correlação entre a ingestão de gordura e a taxa de mortalidade cardiovascular.
Considerando esses dois trabalhos, podemos questionar a afirmação de que "a redução ou o controle da ingestão de gordura sob supervisão médica, com razoável substituição das gorduras saturadas por gorduras polinsaturadas, é recomendada como um possível meio de prevenir aterosclerose e diminuir o risco de infartos e derrames" que aparece na recomendação do AHA em 1961. E parece ainda mais questionável dizer que "esta recomendação é baseada nas melhores informações científicas disponíveis."
No ano de 1977 o Senado dos EUA, em uma louvável tentativa de recomendar a população de seus país a dieta mais saudável possível e diminuir a taxa de mortalidade cardiovascular, lança as conclusões de uma comissão chamada Comissão McGovern (1968-1977) sobre esse tema. Esta comissão recomenda que os americanos reduzam a ingestão de gorduras de origem animal, substituam a gordura saturada por gordura polinsaturada (óleos vegetais), reduzam a ingestão de ovos, manteiga e alimentos ricos em colesterol e também deem preferência aos alimentos com baixa quantidade ou sem gordura [4]. Esta comissão também recomendou um aumento da ingestão de carboidratos complexos e a utilização de óleos vegetais que se tornam os "anjos da guarda de uma vida saudável" e a gordura “o vilão causador de todos os males do coração”!
Bem! Era esperado então, que depois disso a saúde das pessoas viesse a melhorar. Porém não foi isso que aconteceu, vejam o gráfico abaixo e notem o que aconteceu com depois 1977.
A recomendação para que os americanos comessem menos gordura, menos ovos, menos manteiga e comessem mais carboidratos complexos e óleos vegetais coincide com um aumento no percentual de pessoas com sobrepeso ou obesidade de quase 35% em 1978 para mais de 65% em 2008!
Beleza Carlinhos, mas os dados que tu apresentaste são de trabalhos realizados na década de 1950 e 1960, de lá pra cá a ciência evoluiu e outros trabalhos foram realizados. O que esses trabalhos dizem?
OK! Então vamos ver o que os trabalhos científicos produzidos depois dos anos de 1960 têm a dizer sobre esse tema.
The Nurse´s Health Study [3]
Neste trabalho 80.000 enfermeiras entre 39 e 54 anos foram observadas durante 14 anos. Através de questionários foi avaliada a ingestão de gordura total, colesterol e gordura saturada. A conclusão do trabalho fala que a substituição de gordura saturada e gordura trans por gordura monoinsaturada é mais efetiva para redução do risco de doenças cardiovascular do que a redução da quantidade de gordura total.
The Nurse´s Health Study - Diabetes Type 2 [4]
Trabalho também feito entre enfermeiras, mas nesse caso foram selecionadas 5672 mulheres entre 30 e 55 anos portadoras de diates tipo 2. Através de questionários foi avaliada a ingestão de gordura saturada, colesterol e gordura total. Os resultados levaram os autores à conclusão de que a ingestão elevada de gordura saturada e colesterol aumenta o risco de doenças cardiovasculares em mulheres diabéticas. E que a substituição de gordura saturada por gordura monoinsaturada é efetiva para diminuição do risco cardiovascular.
Swedish Women Health [5]
Através de questionários foram avaliadas 43.396 mulheres entre 30-49 anos, por um período de 15 anos. Foram medidas a ingestão de gordura total, de gordura saturada e monoinsaturada, a ingestão de proteína e carboidratos. A conclusão do trabalho foi de que a ingestão de dietas ricas em gordura e pobres em carboidratos eleva o risco de doenças cardiovasculares.
É por considerar somente estudos deste tipo (observacionais) que a maioria dos médicos, nutricionistas e outros profissionais da saúde acreditam que gordura, principalmente a saturada seja ruim para a saúde. Porém é importante lembrar que estes tipos de estudos mostram somente uma correlação entre gordura e risco cardiovascular e não causa-efeito. Neste tipo de estudo científico uma série de outras variáveis estão presentes, como tabagismo, obesidade e diabetes e não é possível controlar diretamente todos os fatores. Para saber mais sobre o que são estudos observacionais clique aqui.
Assim quando lemos estas conclusões o que realmente deveria ser entendido é: existe uma correlação entre gordura e risco cardiovascular. É necessário agora que estudos experimentais sejam realizados para que variáveis sejam controladas e ai avaliar com exatidão se existe ou não uma relação de causa e efeito. Para saber mais sobres o que são estudos experimentais clique aqui.
Beleza Carlinhos! O que dizem os estudos experimentais sobre esse tema? Vamos ver isso então!
MRFIT - Multiple Risk Factor intervation Trial [6]
Este trabalho avaliou a mortalidade entre dois grupos, um deles com uma dieta com redução da gordura saturada para 10% das caloiras totais, menos de 300mg de colesterol ingerido e um aumento para 10% das calorias das gorduras poliinsaturadas (exemplo: omega 3 e 6). O outro grupo foi orientado a manter a sua dieta normal. Após 7 anos de estudo foram avaliados 12866 homens com alto risco cardiovascular e os resultados não mostraram diferença na mortalidade entre os dois grupos.
WHI - Women's Health Initiative [7]
Este estudo teve o objetivo de avaliar se uma redução na ingestão de gordura, aumento da ingestão de frutas poderia reduzir o risco de câncer de mama e doenças cardiovasculares. 48835 mulheres ente 50-79 anos foram dividas aleatoriamente em um dos dois grupos [dieta normal o dieta co redução de gordura]. Após 8 anos não houve redução significativa no número de casos de problemas cardiovasculares, derrames, ou câncer.
Diabéticos Tipo 2 [8]
Neste trabalho 32 paciente com diabetes tipo 2 foram divididos em dois grupos, um com uma dieta reduzida em gordura e outro com uma dieta com restrição de carboidratos e maior ingestão de gordura e proteínas. A dieta com mais gordura e proteínas gerou melhora no metabolismo de insulina, nos níveis de triglicerídeos e função cardíaca. Nenhuma melhora nessas variáveis teve alteração no grupo com redução de gordura.
A conclusão do estudo indica que com redução de carboidratos e aumento da ingestão de proteína gordura, mas não uma dieta com redução de gordura e alta quantidade de carboidrato, melhora a função cardíaca de pacientes diabéticos com sobrepeso, melhora a resistência à insulina e pode prevenir ou retardar o início de doenças cardíacas e da síndrome metabólica.
Considerando estes estudos experimentais, que são aqueles mais adequados para avaliar se existe uma relação de causa e efeito, podemos dizer que não existem evidências científicas para que algum profissional da saúde diga que a gordura natural dos alimentos aumenta o risco de doenças cardiovasculares.
Além dos estudos observacionais e experimentais, existem também as meta-análises (para saber mais sobre isso clique aqui). Estes estudos incluem uma série de outros estudos, aplicam uma nova estatística e então nos fornecem dados bastante confiáveis. O que será que estudos desse tipo dizem sobre gordura e risco cardiovascular?
Vamos ver isso agora!
Cochrane Fat Study [9]
Para este trabalho foram selecionados 27 estudos experimentais randomizados envolvendo um total de 30.900 pessoas. Os resultados demonstraram que a redução da quantidade total de gordura não teve nenhum efeito sobre a mortalidade total. Que a redução da mortalidade cardiovascular não apresentou nenhuma associação com a redução da gordura e que a redução da gordura na dieta apresentou uma associação fraca com a redução da gordura na dieta.
Nas palavras dos autores: "Existe pouco efeito sobre a mortalidade total. Apesar de décadas de esforço e milhares de pessoas estudadas, ainda há apenas evidências limitadas e inconclusivas dos efeitos da modificação do total, saturados, monoinsaturados ou polinsaturados gorduras sobre a morbidade e mortalidade cardiovascular."
Satured Fat Study [10]
O objetivo desta meta-análise foi para resumir a evidência relacionada com a associação de gordura saturada na dieta com risco de doença cardíaca coronária, acidente vascular cerebral e doenças cardiovasculares em estudos prospectivos de coorte (observacionais). Foram selecionados 21 estudos que tiveram duração de 5-23 anos envolvendo 347.747 pessoas.
Na conclusão do trabalho os autores dizem: "Esta meta-análise de estudos epidemiológicos prospectivos demonstraram que não existe qualquer evidência significativa para concluir que a gordura saturada na dieta está associada com um risco aumentado de doenças coronarianas ou derrame."
Restrição de Carboidratos e Risco Cardiovascular [11]
Este trabalho analisou uma série de estudos que comparam uma dieta com restrição de carboidratos e maior ingestão de gordura com uma dieta com restrição de gorduras e maior quantidade de carboidratos e as influências geradas sobre os fatores de risco cardiovasculares. Fora analisados os estudos publicados entre 1966 e 2013.
Os autores concluíram que os estudos experimentais randomizados analisados mostraram que as dietas com restrição de carboidratos não apenas e maior ingestão de gorduras não somente diminuem o peso corporal, mas também melhoram os fatores de risco cardiovascular. Considerando essas fortes evidências científicas, é muito importante que as orientações dietéticas sejam ser revisadas, de forma que dietas com redução de carboidratos e mais gordura natural seja considerada uma estratégia alimentar capaz de prevenir a obesidade e melhorar os fatores de risco para as doença cardiovascular.
Gordura Dietética e Risco Coronário [12]
Esta meta-análise envolveu 32 estudos observacionais (512 420 participantes), 17 estudos observacionais (25.721 participantes) e 27 ensaios estudos experimentais randomizados (105 085 participantes). O objetivo do trabalho foi resumir as evidências científicas sobre gordura saturada e risco cardiovascular. Os resultados demonstraram que:
Não existem evidências de que a gordura saturada aumente o risco de doenças cardíacas;
Não existem evidências de que as gorduras insaturadas (óleos vegetais) diminuam o risco de doenças cardiovasculares;
As gorduras trans são as gorduras que realmente aumentam os riscos de eventos cardiovasculares.
Os autores então concluíram que “a evidência atual não apoia as diretrizes cardiovasculares que estimulam o consumo de ácidos graxos poli-insaturados (óleos vegetais) e a redução da ingestão de gorduras saturadas”.
Bem! Após analisarmos as informações científicas apresentadas podemos concluir de que a redução da gordura da dieta e o aumento da ingestão de alimentos que não sejam de origem animal com o objetivo de diminuir a mortalidade cardiovascular não possa ser considerada como "cientificamente fundamentada".
Sendo assim os médicos e nutricionistas que afirmam ser a redução da gordura como fundamental para saúde o fazem baseando suas afirmações em "fundamentos científicos fracos" normalmente considerando trabalhos de menor relevância do ponto de vista da hierarquia das evidências científicas.
Referências:
1. Keys, A. 1953. Prediction and Possible Prevention of Coronary Disease. PMID: 13104699 PMCID: PMC1620415
2. Central Committee for Medical and Community Program of the American Heart Association, 1961. Dietary Fat and Its Relation to Heart Attacks and Strokes. PMID: 14447694
3. Hu FB, et al. 1997. Dietary fat intake and the risk of coronary heart disease in women. DOI: 10.1056/NEJM199711203372102
4. Tanasescu M,e tal. 2004. Dietary fat and cholesterol and the risk of cardiovascular disease among women with type 2 diabetes. DOI: 10.1093/ajcn/79.6.999
5. Lagiou P, et al. 2012. Low carbohydrate-high protein diet and incidence of cardiovascular diseases in Swedish women: prospective cohort study. PMID: 22735105
6. Autores não listados. 1982. Multiple risk factor intervention trial. Risk factor changes and mortality results. Multiple Risk Factor Intervention Trial Research Group. PMID: 7050440
7. Howard Bv, et al. 2006. Low-Fat Dietary Pattern and Risk of Cardiovascular Disease. The Women's Health Initiative Randomized Controlled Dietary Modification Trial. DOI: 10.1001/jama.295.6.655
8. Bibra, Hv, et al. 2014. Low-carbohydrate/high-protein diet improves diastolic cardiac function and the metabolic syndrome in overweight-obese patients with type 2 diabetes. https://doi.org/10.1016/j.ijcme.2013.12.001
9. Hooper L, et al. 2001. Dietary fat intake and prevention of cardiovascular disease: systematic review. PMID: 11282859
10. Siri-Tarino PW, et al. 2010. Meta-analysis of prospective cohort studies evaluating the association of saturated fat with cardiovascular disease. DOI: 10.3945/ajcn.2009.27725
11. T.Hu, L.A.Bazzano. 2014. The low-carbohydrate diet and cardiovascular risk factors: Evidence from epidemiologic studies. https://doi.org/10.1016/j.numecd.2013.12.008
12. Chowdhury R, et al. 2014. Association of Dietary, Circulating, and Supplement Fatty Acids With Coronary Risk: A Systematic Review and Meta-analysis. DOI: 10.7326/M13-1788
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