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Por que um programa de exercícios com abordagem evolutiva?


O padrão humano de atividade física foi estabelecido por milhares de anos de seleção natural pelos quais nossa espécie passou. Mesmo com todas as alterações no nosso estilo de vida, a constituição genética do homem contemporâneo se mantem sem alterações significativas nos últimos 50 milênios.


Considerando a manutenção das características genéticas da nossa espécie e as inúmeras influências positivas de um estilo da vida ancestral sobre nossa saúde (que foram demonstradas em uma postagem anterior), a adoção de um programa de treinamento físico que reproduza esses padrões de atividade física parece ser o mais indicado para atingir o melhor condicionamento físico condizente com a saúde.


As atividades dos nossos ancestrais envolviam basicamente a caça, a busca e coleta de outros alimentos, construção de abrigo e ferramentas. Isto levava a um maior grau de atividade física e gasto de energia. Atualmente somente conseguimos os mesmos níveis de atividade física e gasto calórico se incluirmos um programa exercício na nossa rotina diária.


Mas que características tinham as atividades físicas dos nossos ancestrais? Essa resposta não é simples, e por isso ela será dividida em partes. Hoje trato sobre as atividades aeróbicas na rotina dos nossos ancestrais.


As atividades aeróbicas faziam parte da rotina diária dos nossos ancestrais e influenciaram a neurobiologia humana, principalmente aos esforços de longa duração. Elas estavam relacionadas com as demandas de sobrevivência exigidas pelo meio ambiente durante nossa evolução.


As evidências científicas sugerem que a troca de um estilo de vida fisicamente ativo em ambiente natural ao ar livre para um estilo de vida sedentário em ambientes fechados está na raiz de muitas das doenças crônicas presentes atualmente. Podemos chamar isso de “Zoológico Humano”.


Embora a relação entre a herança genética, estilo de vida e saúde pareça clara, os pesquisadores dão menos atenção para a possível influência da nossa carga genética nas adaptações fisiológicas ao treinamento atlético e subsequente desempenho esportivo e saúde.


Porém, a área da genética esportiva tem proporcionado informações importantes sobre a carga genética específica para uma maior capacidade de resposta às várias modalidades físicas e desportivas. Características individuais como força muscular, massa corporal magra, tamanho do coração e dos pulmões influenciam o desempenho físico.


É interessante analisar as evidências ligando estímulos de treinamento e as respostas fisiológicas com o padrão de atividade física que moldou o genoma humano através das pressões da seleção natural. Isto permite que verifiquemos as melhores adaptações fisiológicas e consequentemente um melhor desempenho e saúde são atingidos.


Em resumo, o melhor programa de treinamento para atingirmos saúde e condicionamento físico é aquele que considere nossa herança genética como espécie, ou seja, um programa de treinamento e atividade física evolutivo.


Mas quais são as características e elementos que compõem esse programa evolutivo? Essa e outras repostas serão tema de postagens futuras.


Abrços,

Carlinhos


*Se você quiser saber mais sobre esse tema leia o texto que segue!

*Por favor deixe seu comentário sobre essa postagem ao final do Conteúdo Aprofundado.


 

Conteúdo Aprofundado


O padrão humano de atividade física não foi estabelecido em academias, ginásios, pistas de atletismo ou laboratórios de fisiologia do exercício. Ele foi determinado por milhares de anos de seleção natural pelos quais nossa espécie passou [1]. Quando o DNA mitocondrial humano é analisado observa-se que sua origem se deu entre 160 e 250 milhões de anos atrás [2], mostrando que mesmo com todas as alterações no nosso estilo de vida depois da agricultura e da industrialização, a constituição genética do homem contemporâneo se mantem sem alterações significativas nos últimos 50 milênios [1].


Considerando a manutenção das características genéticas da nossa espécie e as inúmeras influências positivas de um estilo da vida ancestral sobre nossa saúde, a adoção de um programa de treinamento físico que reproduza esses padrões de atividade física parece ser o mais indicado para atingir o melhor condicionamento físico condizente com a saúde.


As atividades dos nossos ancestrais (assim como das populações atuais não ocidentalizadas) envolviam basicamente a caça, a busca e coleta de outros alimentos, construção de abrigo e ferramentas entre outras atividades [3]. Estas tarefas faziam com que o gasto calórico diário dos nossos ancestrais fosse muito mais alto do que o nosso nos dias de hoje. O quadro abaixo (adaptado da referência [4]) mostra um comparativo do metabolismo basal e do gasto calórico diário entre diferentes populações.


Estimasse que os primeiros Homo Sapiens tivessem um gasto energético diário de 2.889 Kcal/dia, um integrante da Tribo Ache (Paraguai) cerca de 3.327 Kcal/dia, um cidadão sedentário de um país ocidental cerca de 2.000 Kcal/dia. Com isso é possível afirmar que um humano moderno somente atinge um gasto calórico equivalente ao período da nossa evolução se ele incluir a atividade física/exercício na sua rotina diária. É importante frisar que com a inclusão de um programa treinamento e atividades física em nossa rotina diária, além do aumento do gasto calórico, teremos uma série de benefícios para saúde.


Esse programa de treinamento deve ter como base fundamental as características hereditárias de nossa espécie, pois teoricamente são aquelas que melhor se encaixam com as demandas de sobrevivência exigidas pelo meio ambiente existente durante a evolução humana e são produto de milhões de anos de interação gene-ambiente. Um novo estilo de vida pode ter interrompido as informações genéticas da nossa espécie e os requisitos ambientais para a nossa sobrevivência saudável, pois a nossa herança genética não foi alterada significativamente desde o Paleolítico e nossos ancestrais viveram como caçador-coletores por 84.000 gerações [5]. As adaptações selecionadas para a sobrevivência durante o período da evolução podem ter se tornado adaptações ruins sob a atual mudança ambiental da atividade física, ou seja, inatividade [6].


As evidências científicas sugerem que as modernas doenças metabólicas e cardiovasculares estão relacionadas com a alteração no estilo de vida humana que ocorreu nos últimos séculos, a troca de um estilo de vida fisicamente ativo em ambiente natural ao ar livre para um estilo de vida sedentário em ambientes fechados está na raiz de muitas das doenças crônicas presentes atualmente [7]. A inatividade física aumenta o risco relativo de doença arterial coronariana em 45%, acidente vascular cerebral em 60%, hipertensão em 30% e osteoporose em 59% [6] e a solução para isso parece estar em simular o padrão de atividade humana ancestral considerando o modo de exercício, a duração, a intensidade e a frequência que estão relacionadas com nosso genoma [7].


Esta dissonância entre a condição ambiental da Idade da Pedra e o ambiente moderno é a base da chamada hipótese da incompatibilidade que tem sido utilizado pela medicina evolutiva para explicar as doenças modernas. Williams & Nesse [8] explicam que a evolução por seleção natural tem sido por muito tempo uma fundação para a ciência biomédica, que recentemente ganhou novo poder para explicar muitos aspectos das doenças. Este paradigma de investigação pode ser considerado cada vez mais significativo para prever as facetas da biologia humana e fornecer novas pistas sobre as causas das desordens médicas, tais como infecções, lesões, toxinas, fatores genéticos e ambientes anormais [8].


Embora a relação entre a herança genética, estilo de vida e saúde pareça clara, os pesquisadores dão menos atenção para a possível influência da nossa carga genética nas adaptações fisiológicas ao treinamento físico e subsequente desempenho esportivo e alterações na saúde. A genética do esporte é um campo em crescimento, que tem proporcionado informações importantes sobre a carga genética específica para uma maior capacidade de resposta às várias modalidades físicas e desportivas. As características individuais que podem ser observadas e são consequência da expressão genética de uma pessoa (fenótipo) como força muscular, massa corporal magra, elasticidade dos tendões, tamanho do coração e dos pulmões influenciam o desempenho físico [9]. Este tipo de influência foi demonstrado pela primeira vez cerca de 15 anos atrás [10] quando alterações genéticas de uma enzima conversora de angiotensina, que está envolvida no controle do volume de líquido extracelular e da pressão arterial, foram associadas a uma maior capacidade de desempenhos que envolvam atividades de endurance/resistência. Outro exemplo é a influência do gene receptor de vitamina D sobre a força de mulheres antes e após a menopausa e também em homens idosos [10].


Assim é possível afirmar que analisar as evidências ligando estímulos de treinamento e as respostas fisiológicas com o padrão de atividade física que moldou o genoma humano através das pressões da seleção natural pode ser de extremamente importante e vital. Em outras palavras, uma hipótese atraente pode ser que as atividades que favoreceram a sobrevivência durante o Paleolítico podem gerar as melhores adaptações fisiológicas e consequentemente um melhor desempenho do que programas de treinamento que desconsiderem essa abordagem evolutiva [11].


Mas que características tinham a atividade física dos nossos ancestrais? Como deve ser um programa de exercícios com abordagem evolutiva? Essas respostas não são simples e por isso farão parte de uma série de postagens futuras que têm como objetivo elucidar esse tema.


Abraços,

Carlinhos


Referências:


[1] Cordain L, Gotshall RW, Eaton SB, Eaton SB III. Physical activity, energy expenditure and fitness: an evolutionary perspective. Int J Sports Med 1998;19:1–8. DOI: 10.1055/s-2007-971926


[2] Vigilant L, et al. 1991. African populations and the evolution of human mitochondrial DNA. DOI: 10.1126/science.1840702


[3] O'Keefe JH, et al. 2010. Organic fitness: physical activity consistent with our hunter-gatherer heritage. DOI: 10.3810/psm.2010.12.1820


[4] Cordain L, et al. 1997. Evolutionary aspects of exercise. PMID: 9287503


[5] Fenner JN. 2005. Cross-cultural estimation of the human generation interval for use in genetics-based population divergence studies. DOI: 10.1002/ajpa.20188


[6] Booth FW, Lees SJ. 2007. Fundamental questions about genes, inactivity, and chronic diseases. DOI: 10.1152/physiolgenomics.00174.2006


[7] O’keefe JH et al. 2010. Achieving hunter-gatherer fitness in the 21(st) century: back to the future. DOI: 10.1016/j.amjmed.


[8] Williams GC, Nesse RM. 1991. The dawn of Darwinian medicine. PMID: 2052670


[9] Puthucheary Z, et al. 2011. Genetic influences in sport and physical performance. DOI: 10.2165/11593200-000000000-00000


[10] Puthucheary Z, et al. 2011. The ACE gene and human performance: 12 years on. DOI: 10.2165/11588720-000000000-00000


[11] Boullosa DA, et al. 2010. Effectiveness of polarized training for rowing performance. PMID: 21266728

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